Prepare-se!
Barcelona, 10 de fevereiro de 2025.
Por @1flaviocarvalho, sociólogo e escritor.
(espero que te agrade; mas, se não agradar, também tá valendo)
“Respeitem meus cabelos, brancos”
(Chico César).
– Atenção pra essa vírgula.
Eu sou de Peixes, como a Flavinha. O PT é de Aquário. A gente sempre se deu bem.

Sonhadores. Utópicos, melhor dizendo.
Cabeça cada vez mais livre nas nuvens. E pés bem firmes (considerando as raízes) no chão.
O PT está de parabéns. Felicitemo-nos, a nós mesmas.
Eu tenho mais anos de vida vinculado a esse partido do que de anos vividos, na minha vida, sem ele, sem o PT.
Portanto, me reservo o direito de fazer a análise que eu e o PT bem merecemos.
Nossa relação, como as melhores amizades e amores, está baseada na confiança, no diálogo (sempre sincero e construtivo, claro) e no respeito (mútuo, por favor). Vamos lá.
1. Li, recentemente, um livro chamado Geração Rolha (Generació Tap, em catalão). Trata-se de uma análise sociológica de como toda uma geração de pessoas totalmente bem-intencionadas na política, sem querer (ou sem querer, querendo; lá no fundo) atrapalham, emperram, interrompem o surgimento natural de novas lideranças. Esse seria o meu primeiro presente de 45 anos pro PT. De já não tão jovem para já não tão jovem. Deixemos que a juventude faça o que tem de melhor: a capacidade de reconstruir revolucionariamente sobre bases sólidas. Quanto mais rebeldia melhor. O oposto a isso já será um pensamento conservador por natureza. Lamento informar.
2. Eu daria a Lula a aposentadoria bem-de-vida que ele merece (sem ironia). Nós também merecemos. O bom jogador merece retirar-se sempre no melhor momento, antes que a bola comece a cair, naturalmente, pela lei da vida. Querer bem é não exigir mais do outro pensando mais em nós mesmos, de forma egoísta (ainda que disfarçada de altruísmo). E os melhores jogadores custam mais a admitir o próprio cansaço, já dizia Pelé. Pois querem seguir dando o melhor de si. O importante é que esse Melhor de Si jamais signifique aquilo de manter milhões de pessoas pensando em deixar para aquele Melhor fazer o que Elas mesmas deveriam estar fazendo por si próprias. Dessa vez não é nada político e sim pessoal mesmo. Eu olho pro Lula, cada dia, faz muitos anos e, sendo consciente de como a política desgasta a vida pessoal das pessoas (pleonasmo proposital), é esse o meu desejo sincero. Sem NENHUM medinho de ser feliz.
3. Dito isso, eu começaria a não ter medinho de começar a pensar no futuro do partido, Com, mas também Sem Lula. Se bem que quem conhece Lula sabe que ele jamais vai estar longe da gente. E isso não é nada mal pra ele, nem para nós. Se Lula é, sim, a cara do Brasil, essa outra cara pode ser ainda melhor (sim, pode). Tá na cara. Só você finge que não vê. Mas o seu espelho não tem culpa: a culpa é tua, e não dele, do espelho. Chama-se Hipocrisia, a pior mentira, o mentir pra si.
4. Há uma publicação recente, genial, muito bem-feita, na Internet (grátis, online), da Fundação Perseu Abramo. Depois de algumas falas institucionais (insossas, posso dizer), abrindo eternamente essa publicação, o melhor do livro está no final. Trata de uma análise jornalística de qualidade sobre o registro audiovisual de fundação do PT. Lá estão as principais chaves para entender o presente. Foi um presente magistral da jornalista Rita Camacho para todas nós. Meus presentes seguintes, meus nove pontos posteriores, consideram muito do que está escrito nesse texto excelente, da Rita.
5. “Viva o Partido dos Trabalhadores! E das Trabalhadoras!”. Assim termina o mencionado texto. Se você acha que isso é pouco importante na história do partido (não creio que seja o que pensa a jornalista, que assim o fez, sem “deixar passar”), sugiro que a sua revisão deste ponto reoriente tudo aquilo que você deseja não somente para o partido e sim para todo o nosso país. Já leu o livro do Douglas Barros, O que é Identitarismo, publicado pela Boitempo? Leia. E depois venha dialogar mais, se quiser. Será um prazer pra mim. Que o recomendo muito.
6. “Tinha gente muito conservadora” já na assembleia de fundação do PT, exatamente 45 anos atrás no Colégio Sion, diz o texto. Há um vídeo do companheiro, jornalista, Breno Altman, recente, afirmando que o Lula é Conservador (em certos ou diversos aspectos). Deu reboliço tanto quanto o anterior depoimento público de ninguém menos que Zé Dirceu, caracterizando o partido como “de Centro-Direita” (em certos ou diversos aspectos). Se você sentiu apenas raivinha com essas análises (mais raivoso ainda quando assistiu isso nas redes do Jones Manoel) e não as parou para analisar em profundidade (até para ter mais argumento para discordar, sempre respeitosamente), sugiro 7 dias de meditação silenciosa. Aqui em Barcelona, gratuitamente, tem. Ódio é coisa de fascista, jamais esqueça disso. Gado é do outro lado. Baba-Ovo aqui não, por favor. João Paulo foi prefeito petista do PT dedicando parte das suas preciosas manhãs à meditação. O slogan mais bonito da prefeitura Joãopaulista era esse. Sente só: A grande obra é cuidar das pessoas. Não é tudo de bom?
7. “É só olhar para a fisionomia das pessoas, era uma idade entre 30 e 40. Cinquenta anos, no máximo”; “é preciso olhar com lupa para ver onde estão as mulheres na cena”. São francas palavras de Olívio Dutra, fundador do PT, presentes no texto. O que mudou de lá pra cá. O que esperar? Volte algumas casinhas, releia e nem precisa me responder mais nada. Faça como João Paulo. E nem precisa deixar o PT e filiar-se ao PCdoB, como acabou fazendo, ele.
8. “O PT manifesta sua solidariedade à luta de todas as massas oprimidas do mundo”. Tudo bem que Massas e Oprimidas são expressões bem de décadas passadas. Mas que fazem todo sentido ao construir-se um partido internacionalista que chegou a ser o maior da América Latina e um dos maiores do mundo. Agora que danado alguém me explique o que faz o “problema da comunicação” substituir o antigo comunicador-mor do governo petista por um cuja primeira grande foto é botar um boné no presidente arrepiando a pele de milhões de brasileiros no exterior que, como eu, defendemos exatamente o contrário: o transnacionalismo e a cidadania universal de qualquer pessoa, anti xenofobia (trumpista ou qualquer outra). Olhar pra dentro e olhar pra fora: bora, PT.
9. “Começou a tornar-se cada vez mais claro para os movimentos populares que as suas lutas imediatas e específicas não bastam para garantir a conquista dos direitos e dos interesses do povo trabalhador… Por isso, o PT nasce da decisão dos explorados de lutar contra um sistema econômico e político que não pode resolver os seus problemas, pois só existe para beneficiar uma minoria de privilegiados”. Privilégio?! Volte de novo duas ou três casinhas nesse meu textinho. Cai bem.
10. “Quando a água bater na bunda ele, o trabalhador, virá”. Essa é a frase mais emblemática do texto, do nosso maior líder partidário, sobre a conjuntura que se arrasta, de 1980 para cá. Bunda de quem? A água não sobe igual para todo mundo. Esse deveria ser o grande aprendizado. Lá estava Paulo Freire, entre os primeiros a assinar a primeira ata do PT. Quem não aprendeu (ainda) com isso, está em tempo. Mas, corre que o ritmo não é o mesmo pra todo mundo, por favor.
11. Todas podemos estar de acordo com o sentido da coisa. O Pra onde vai esse rio. A grande questão para uma maioria imensa de pessoas que cresceu e viveu com o PT dando vazão aos seus sentimentos é perguntarmo-nos o quanto também servimos (sim, isso é possível e compatível) para estabelecer mais represas invisíveis. Pois, dizia Brecht: Do rio que tudo arrasta se diz violento, mas ninguém diz violento as margens que o oprimem. “Soltemos” o rio e confiemos freireanamente nele.
12. Você acha realmente que esse imenso partido deve “resumir-se” (fazer isso, sim, mas somente isso, não) a impedir a volta do bolsonazismo? Tanto que até adote alguma postura conservadora, com medo de que a verdadeira transformação radical que a maioria do nosso povo merece, esteja sossegadamente preservada debaixo dos nossos próprios privilégios barbudos?
13. Se o Brasil precisa de psicanálise (eu acho que, sim, precisa), o PT precisa menos de sociólogos (como eu, desculpe) e mais de psicólogos. Mais olhar pra dentro e menos pra fora. Mais conhecer-se a si mesmo e menos lidar com o medo do diferente, “lá fora”. Contanto que o melhor psicólogo de você seja você mesmo. E que isso não signifique desprezar o acompanhamento psicológico (profissional) de quem faz anos que se dedica e estudou pra isso. Freud explica. Mas, nem tudo…
PS.: Estive recentemente no nosso Pernambuco e conheci pessoalmente Jones Manoel. Escutá-lo, diariamente, fazendo as críticas mais contundentes (desafio a que me demonstrem qualquer desrespeito) ao PT faz-me pensar mais ainda no quanto é importante estar dentro desse partido pra fazer com que ele seja, volte a ser ou passe a ser exatamente aquilo que a Rita Camacho relatou.
Aquele abraço. E viva o PT.
Nota: Os textos, citações e opiniões deste texto podem não expressar – no todo ou em parte, a opinião dos Coletivos da Fibra.