Holanda, 14 de Julho de 2021.
Há pouco, recebi um vídeo contendo mensagem do Prefeito de Belém/PA, Edmilson Rodrigues (PSol). Nele, expressa sua solidariedade ao povo cubano diante dos acontecimentos dos últimos dias. A tal “revolta popular”, amplamente divulgada (e festejada) pela imprensa corporativa no Brasil e no mundo demonstrou, desde o domingo passado, que há que se estar atento às narrativas que correm a explicar as imagens das manifestações que tomaram as ruas de Cuba. Imagens que mostram uma rara situação de protestos, aparentemente motivada pelo agravamento de uma crise financeira, que tudo indica ser causada pela combinação do aprofundamento do embargo econômico à Ilha, na era Trump, e pelos consequentes desdobramentos da pandemia – em que a falta de respiradouros para UTI é apenas uma das enormes dificuldades enfrentadas. Criminoso o embargo que torna ainda mais cruel a realidade imposta pelo vírus.
A fala de Edmilson pontua com profundo conhecimento de causa, especialmente os aspectos políticos do que ali se passa. Tudo leva a crer que a realidade escondida por trás das imagens veiculadas pela imprensa, indica outra investida imperialista para golpear novamente os legados sociais da revolução cubana. Eu, porém, conterrânea e colega de profissão do prefeito Edmilson – além de sua amiga há muitos anos – percebi bem mais do que o vídeo nos exibe. Emocionei-me com o que vi, e isso me inspirou ao registro que aqui faço, neste dia.
Explico minha motivação voltando no tempo e relatando dois episódios, para mim simbólicos e que servem de baliza para avaliar a grandeza da fala de Edmilson.
Em meados de 2019, o Coletivo Amsterdam articulava a vinda de Dilma para uma palestra na cidade. Lula estava preso e sua liberdade era bandeira de luta nossa e da Frente Internacional Brasileira (FIBRA). A despeito de qualquer crítica que se tenha ao governo dela, sua figura de retidão e coragem sempre nos inspirou sua defesa. Dilma revelou-se mulher resistente aos golpes impetrados pela misoginia a que esteve sujeita, deixando fluir nos encontros do exterior, um estilo capaz de dialogar com a militância internacional de forma direta e companheira. Qualidades que aumentaram ainda mais o carinho e admiração de muitos pela Presidenta aqui na Holanda. Naqueles dias, Dilma realizou várias turnês internacionais, onde denunciava e explicava o Golpe sofrido em 2016 e pedia justiça e liberdade para Lula. Nossa motivação foi rapidamente compreendida pelos holandeses e o evento lotou em menos de vinte e quatro horas! Como ex-chefa de Estado, havia um protocolo a seguir. Entramos em contato com a assessoria da recém-empossada prefeita de Amsterdam (Femke Halsema/GroenLinks) para que recebesse a Presidenta Dilma, tal como recomendava o protocolo habitual. Pelo fato da prefeita ser integrante da esquerda verde, achamos que seria tranquilo agendar com ela. Para nossa surpresa, recebemos um Não, sob a razão de que a prefeita não se envolveria em política partidária de outros países! 😠 Bizarro e verdadeiro!…
Pouco tempo depois, alguns grupos, coletivos e comitês organizados na Europa, especialmente em Paris, por brasileiros e brasileiras progressistas, agendaram encontro semelhante com a Prefeita de Paris, Anne Hidalgo, eleita anos antes pelo Partido Socialista. Anne não somente compreendeu a importância da causa dos militantes e ativistas, como ainda patrocinou um evento público custeado pela prefeitura. Nele, ofereceu solidariedade à Lula, concedendo-lhe o título de Cidadão de Paris. Desta forma, a prefeita de Paris empenhou sua empatia com a luta e os feitos do ex-Presidente Lula! Anne Hidalgo empunhou a coragem dos que tem por hábito o compromisso com causas justas. Foi além e mais além do que ousara lhe pedir a militância. Ela o fez por acreditar na causa, depositando no gesto político a envergadura do seu cargo, e sinalizando a importância de tal defesa. A diferença de postura entra as duas prefeitas foi gigante naquele contexto político perante toda a comunidade militante internacional. Diferença que situa, uma e outra, no lado da história que escolheram trilhar na vida pública.
E foram esses dois episódios que arrebataram em mim a emoção com o vídeo do Edmilson. Seu relato pessoal e emocionado, emprestando o peso do cargo que ocupa em solidariedade com o povo cubano demonstra a mesma coragem de Anne ao assumir o compromisso com uma causa justa. Suas belas palavras são ato concreto. A fala é forte e posiciona o prefeito de Belém sob o contexto expresso por Fidel a cerca da solidariedade internacional.
Confira o vídeo que transforma um discurso corajoso, em importante e oportuno ato solidário! Daqueles que tanto fazem falta nos dias de hoje!
Aqui da Holanda, envio votos de força e sabedoria ao povo cubano. Para que resistam com a ternura revolucionária com que vêm escrevendo sua história e que lhes é peculiar, desde sessenta anos!
“Yo he visto al águila herida
Volar al azul sereno
Y morir en su guarida
La víbora del veneno”. Pablo Milanés.
Ana Isa v Dijk
(Arquiteta e urbanista; ativista fundadora do Coletivo Amsterdam e da FIBRA-Frente Internacional Brasileira pela Democracia e contra o Golpe).
