6 resumos, muita complexidade.
De Flávio Carvalho, para o site da FIBRA.
@1flaviocarvalho, @quixotemacunaima. Sociólogo e Escritor.
Barcelona, 24 de julho de 2023.
A Espanha é o país do mundo onde os mortos estão mais vivos do que nunca, disse alguém, certa vez. A Guerra Civil mais longa da história ainda é um tabu para muitas famílias. O país do ditador que – diferente de Mussolini, enforcado, e Hitler, suicidado – morreu na cama, de velhinho, com honras de Chefe de Estado. E um dos poucos de toda a Europa que ainda permite que o partido de Franco, a Falange, exista e receba subvenção pública – em nome de uma falaciosa liberdade de expressão.
O dia que mais se fala de política partidária, na Espanha, é no dia seguinte às eleições, quando os votos já estão apurados e a sorte já está lançada. O voto não é obrigatório e a abstenção é grande. Com poucos votos, proporcionalmente, se elege o Parlamento. A política partidária espanhola é considerada uma das mais complicadas do mundo. Os dois últimos presidentes, Rajoy e Sánchez, chegaram a ficar mais de 300 e de 200 dias, respectivamente, como Presidentes Em Função, que é como eles chamam aqueles que foram eleitos pelo parlamento como presidentes (e nomeados pelo Rei, é claro) mesmo com poderes limitados, sem votos suficientes, com o bloqueio da maioria de partidos que não os apoiava. Não é novidade o que pode acontecer daqui pra frente, portanto. Mente quem disser que sabe exatamente o que poderá acontecer.
Em Madri, hoje, na sede do Partido Socialista, nunca houve tanta vontade de que a Catalunha já fosse um Estado próprio, independente – pra que a Espanha não houvesse que depender da Catalunha para mais nada. Que ainda depende. Muito! A governabilidade de Pedro Sánchez (ou o pesadelo de ter que repetir as eleições) depende da pessoa que Sánchez menos gostaria de depender. Depende do voto do partido do ex-presidente da Catalunha, independentista de direita, o exilado parlamentar europeu Carles Puigdemont, o único (último?) que hoje poderia decantar a balança a favor de Sánchez. Ou acabar de bloquear tudo.
O que está em jogo? Exatamente o indulto de Puigdemont, que a direita espanhola vaticinou para todos os lados que seria a bola da vez. Sánchez foi o primeiro líder europeu a denunciar o Lawfare contra Lula e posou com um cartaz – cedido por uma militante brasileira da Fibra, em Madri – onde estava escrito: Lula Libre. A primeira líder latino-americana a defender a liberdade dos presos políticos catalães foi a Presidenta Dilma Roussef.
A Espanha é o único país europeu onde, na atualidade, a extrema-direita (fascistas, sem meias palavras, a meu ver), perdeu votos. Na Europa, sempre se comentou que a Espanha era o último dos países a ter uma extrema-direita assumida, grosseira, fascista, bolsonariana. Exatamente porque esse “bolsonarismo” esteve embutido, inserido, contido, dentro do grande partido de direita, herdeiro direto do franquismo, o PP. Abascal, o fascista proprietário de VOX, bem subvencionado com dinheiro público e apoiado pelas grandes empresas, é filho e neto de políticos históricos do PP e, até pouco tempo, era assessor do PP. Atribui-se a perda de votos de VOX, desde poucas semanas atrás, quando cresceu muito nas eleições municipais, a recentes bolsonarismos toscos: censura contra peças de teatro, perseguição contra o idioma catalão (que chegou a ser proibido por Franco) e política de retorno das touradas, por um político toureiro, eleito por VOX.
A última coisa que a Espanha quer debater é sobre como incorporar o voto dos imigrantes, atualmente excluídos do sistema eleitoral. Sendo um dos países europeus com maior quantidade de imigrantes, só existe um partido que defende abertamente, claramente, sem desvios, a possibilidade de que os imigrantes votem e possam ser votados em todas as instâncias: Esquerda Republicana da Catalunha, o partido que elegeu a primeira deputada brasileira para o parlamento espanhol. E que acabamos de perder. Maria Dantas não se reelegeu.
Não é um mero detalhe: os argumentos não assumidos por todo o resto da esquerda espanhola é que não se saberia o que poderia acontecer se votassem, por exemplo, os imigrantes relacionados ao país vizinho, o Marrocos (os maiores em quantidade na Espanha). O maior absurdo é que esse é o mesmo argumento daquela esquerda que no início do século passado impedia o voto das mulheres, dizendo o mesmo: ninguém sabe o que pode acontecer quando as mulheres passassem a decidir elas mesmas, e não os seus pais e maridos.
A economia europeia mais importante para o Brasil, segunda maior em investimentos privados no nosso país, a atual presidência de turno da União Europeia (no exato momento de forçar a aprovação do acordo da UE com o Mercosul), no meio das mais importantes decisões sobre a ofensiva da OTAN na Guerra contra a Rússia… Sem Presidente!
As eleições se repetirão?
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