Frankfurt, 19.04.2025
Texto publicado originalmente na revista Brasilien Aktuell 2025 Internationale Solidarität
Com 850 milhões de hectares de extensão territorial, o Brasil é ainda campeão em concentração fundiária. Essa concentração fundiária é fruto de um histórico de formação nacional marcada por interesses coloniais e, mais tarde, oligárquicos que se mantêm até os dias atuais. Com mais de 60 mil famílias acampadas em todo o Brasil, aguardando a realização da reforma agrária, a conjuntura atual não é nada favorável.

Mesmo com uma tradição oligárquica ligada ao poder local, a reforma agrária entrou como destinação constitucional já em 1988, como um dever do Estado na destinação das terras públicas. Estas têm como destinação constitucional serem transformadas em terras indígenas, florestas nacionais, unidades de conservação para a preservação da natureza e dos biomas, territórios de comunidades quilombolas remanescentes de escravizados e assentamentos rurais da reforma agrária. Territórios de comunidades quilombolas, remanescentes de escravos e assentamentos rurais da reforma agrária.
A reforma agrária é entendida e defendida pelos movimentos sociais e organizações da sociedade civil como uma estratégia fundamental de justiça social, reparação histórica, enfrentamento da fome e enfrentamento da crise climática. No entanto, alguns desafios se impõem. Com a valorização das commodities agrícolas e minerais, em especial a partir da década de 2000, a terra se tornou não apenas o local de produção dessas commodities, mas ela em si se tornou um ativo financeiro extremamente valorizado. Isso torna o processo de aquisição de terras para reforma agrária muito difícil, seja por meio da compra, seja pela desapropriação, já que ambos os caminhos requerem orçamento.
A reforma agrária retira a terra do mercado e, por isso mesmo, tem sido amplamente atacada por meio de projetos de lei em instruções normativas das instituições do Estado, que tornam os lotes dos assentamentos propriedade privada, permitindo sua comercialização, ou então passam a permitir a destinação de áreas de Reforma Agrária para mineração ou grandes empreendimentos como parques eólicos ou barragens de hidroelétricas.
Nesse particular, a transição energética tem sido utilizada como justificativa para disponibilizar territórios para a exploração dos chamados minerais essenciais. Isso, na realidade, representa uma falácia, uma falsa justificativa para a exploração desses territórios, uma vez que minerar em áreas como a floresta amazônica para produzir baterias de carros individuais que vão ser utilizados na Europa é uma incongruência.
O agronegócio no Brasil, setor capitalizado da agropecuária, majoritariamente produtor de commodities para a exportação e altamente degradador do solo, dos recursos hídricos e das florestas segue sendo contrário à realização da Reforma Agrária já que disputa as terras públicas – territórios tradicionais, terras indígenas e de assentamentos rurais, umas vez que estes se mantém preservados por suas populações.
Soma-se o interesse de grandes tradings a quem só importa comercializar commodities, capital financeiro com seus fundos de investimento em terras e o capital extrativista minero exportador. Enquanto isso, a agricultura familiar, comunidades e povos tradicionais seguem lutando pela reforma agrária e pela garantia de direitos territoriais.
Yamila Goldfarb
Presidenta da ABRA – Associação Brasileira de Reforma Agrária
O texto de Yamila Goldfarb foi indicado por Namir Martins, colunista da FIBRA.
Nota: Os textos, citações e opiniões deste texto podem não expressar – no todo ou em parte, a opinião dos Coletivos da Fibra.
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